terça-feira, 22 de dezembro de 2009

ZÉ PERNETA



" A GRANDEZA DE UM HOMEM NÃO CONSISTE EM RECEBER HONRAS,... MAS, SIM, MERECÊ-LAS ! "



Marcha de guerra do Brasil

Por ocasião da SEGUNDA Guerra mundial, combatentes do mundo inteiro foram chamados para servir sua pátria em campos onde jamais imaginaram um dia conhecer.

No caso particular de nosso País - BRASIL, em especial nos Estados da Federação onde a temperatura média nunca atinge frios intensos, a ida dos conhecidos “Pracinhas Brasileiros” foi uma “aventura inesquecível.”

Um jovem, de nome JOSÉ (fictício), operário de uma Cerâmica de Telhas, de uma cidade fundada por italianos, analfabeto, viúvo, de vigor físico invejável foi convocado para defender a pátria nos campos de batalha da longínqua Itália.

Foi um dos combatentes que lutaram bravamente em Monte Castello e renderam os inimigos alemães, acostumados normalmente ao frio, neve, e às artes da guerra.

Zé do Barro, como era conhecido, enquanto em sua cidade pacata, antes da aventura na guerra, passava seus finais de semana pescando lambaris num riacho que cortava a cidade e, esporadicamente, acompanhava amigos na caça de pombos do ar, com rústicas espingardas de um tiro só!. Não era fácil alvejar um pombo; era preciso muita pontaria e esperteza.

Ele não era um bom atirador, pois nem arma teve algum dia.

Era um cidadão comum, trabalhador, pobre, simples, calado e honesto.

Foi convocado, assim como outros o foram, para defender os amigos que nunca houvera conhecido, a não ser pelos italianos que residiam em sua cidade e choravam a desgraça daqueles que ficaram na “Velha Bota”.

Com o coração cheio de emoção e alegria, foi abraçar seus amigos italianos da cidade prometendo que iria lá longe salvar seus parentes e que voltaria trazendo boas notícias.

Que homem exemplar! Não imaginava que com uma vestimenta de um país tropical fosse encontrar um inimigo que jamais houvera imaginado: O Inverno Europeu!

Mas, como tantos outros, embarcou no trem movido a carvão com destino à capital e daí para o porto onde o navio os esperava. E foi para a Itália num “barco grandão” que nunca tinha visto nem por fotografia. Foi uma epopéia a viagem até a Europa, pois o balançar das ondas, durante tantos dias, foi também uma prova de resistência e coragem jamais imaginada por todos.

Entretanto, o congraçamento com todos os pracinhas, em sua maioria também analfabeta, fez com que a viagem fosse amenizada, pois puderam conhecer as diferenças de culturas e costumes do povo brasileiro. Havia pracinha de todas as partes do Brasil, de norte a sul, de leste a oeste.

Todos com uma grande motivação: “Defender a Pátria a qualquer preço!”, sem temores, sem medos, mas tão somente com a coragem, força moral e um grande coração!

Ele tinha um filho chamado Jorge (fictício), rapaz muito forte e, como o pai, trabalhador em uma cerâmica apesar de seus poucos 11 anos de idade.

JORGE não tinha sapatos especiais enquanto trabalhava, mas sim uma bota velha, pois guardava em casa apenas um velho “chinelo espanhol” de cizal e uma botina feita sob medida na sapataria de um italiano de nome Caiaffa. O chinelo usava vez em quando para ir ver jogo de futebol e a botina era seu calçado de ir à missa.

Embora a vida humilde que levavam, eram felizes. Jorge andava pela cidade todo orgulhoso, pois seu pai tinha ido "lá longe" defender os parentes dos seus amigos “ricos” de sua cidade e, com isso, ganhava mais respeito e admiração de todos.

Zé do Barro, estava em Monte Castello e, quando os pracinhas conseguiram atacar os alemães, foi ferido na perna por uma baioneta inimiga de um jovem alemão. Mesmo ferido, sendo muito forte, conseguiu dominar aquele jovem, que ficou deitado no chão e com olhos arregalados fez o sinal da cruz esperando o golpe fatal que o levaria desse mundo.

Ele olhou para aquele menino, de pouco mais de uns 15 anos de idade e, mesmo sofrendo dores horríveis com seu ferimento não foi capaz de golpear aquele que, também sem saber o porquê, estava naquela guerra e o houvera agredido.

Estendeu-lhe a mão e disse ao garoto, chorando e com o coração apertado:
- Vá embora menino. Vai encontrar seus pais e que Deus o abençoe!
- Danke,... sehr Herr !

O menino, assustado, respondeu como podia e foi se afastando trêmulo e admirado com o gesto de Zé do Barro.

Mesmo com fortes dores, amarrou um pano sujo no ferimento e ainda, sem se abater, continuou com seus companheiros na perseguição aos alemães até que esses se rendessem.

Muitos combates, muitos feridos, muitos mortos de ambos os lados, muita tristeza por todo aquele horror que participaram sem ao menos terem pedido e nem saber porque tanta maldade que, em defesa da própria vida, eram todos acometidos !.

Meses depois, pela Graça de Deus, a Guerra terminou. Terminou com muitas dores  para  ele e seus companheiros que lembravam perplexos tantos feridos, tantos desaparecidos, tantos mortos !.

Foi socorrido, mas tardiamente, sendo necessária uma amputação parcial de sua perna já muito infeccionada.  TRISTEZA: tudo era muito rudimentar... não conseguiram evitar aquela tragédia. 

Receberam medalhas de heróis e voltaram para casa traumatizados com os horrores vivenciados.

Ele desembarcou no Rio de Janeiro em uma tarde onde toda população aguardava os Heróis Brasileiros com muita festa. Parentes abraçando seus soldados com o coração apertado, ... mas nenhum conhecido dele  ou de vários outros que residiam tão distante. Mesmo assim, foi abraçado por pessoas que nunca havia visto e nem sabia de onde eram.

O Trem para São Paulo estava lotado de ex-combatentes. Em cada estação, sem exceção, uma parada para homenagens dos cidadãos aos combatentes, sem faltar os discursos do Prefeito, das Senhoras da Liga Católica e finalmente do Padre, flores, rojões, banda musical, Hino Nacional, abraços, beijos.....

A cada vez que o trem iniciava uma nova partida, o silêncio reinante no trem!

Ele, com fortes dores, lembrava-se daquela última cena em que libertou o garoto alemão que poderia ser seu filho... e não se conformava da brutalidade do Ser Humano em ser capaz de eliminar seu Semelhante sem motivos racionais. Que tristeza tanta gente perdendo seus entes queridos por questões tão estúpidas.

Ele não via à hora de chegar a sua casa e abraçar seu filho bem forte e nunca mais sair de perto dele. Lágrimas escorriam de seu rosto de emoção da volta e da tristeza que deixou para trás na Velha Bota.

Olhou para seus amigos no trem e viu muitos mutilados de braços, pernas, ... voltando para suas vidas normais sem a mínima condição de produzirem novamente o sustento para suas famílias. Pensava triste que pelo menos Deus havia permitido-lhe uma perna intacta enquanto outros não tinham mais nenhuma  ou até os braços. Assim, consolado por esta sorte, fixou seu pensamento em voltar à fabrica e continuar seu trabalho.

Até chegar a sua cidade, teve que mudar mais duas vezes (baldeação) de trem.

A cidade toda estava esperando os seus poucos filhos combatentes, preparada ansiosa com uma grande festa de recepção !

O Trem na última curva antes da estação apitava insistentemente enquanto os moradores ladeavam os trilhos acenando bandeirolas e saudando emocionados seus combatentes.

A banda já esperava executando marchas, fogos de artifício não paravam de riscar os ares, os alunos do Grupo Escolar todos uniformizados e com bandeirinhas, os moradores com suas melhores roupas, os italianos chorando a emoção da solidariedade, os cães correndo de lá pra cá como que sentindo a chegada de seus donos e amigos,.... a cidade toda em festa,... uma cena inesquecível.!

Jorgel feliz, não conseguia conter a emoção para rever seu pai que estava ali a poucos minutos da estação.

Chegaram. Que euforia de todos!

Não dá pra conter uma lágrima, mas sim dar vazão a essa alegria de contagia todas as pessoas, a natureza, a vida.... e Deus presente nesse momento trazendo de volta os filhos que inocentemente foram lutar pelos ideais de liberdade e paz.

O dia todo foi de muita festa. Todos queriam saber os detalhes sobre a viagem de ida e volta, sobre a Itália, o frio, a neve, o inimigo.

Os dias se passaram. José estava na fábrica colocando o barro para amassar e fazer as telhas daquela cerâmica, como sempre havia feito desde que era criança.

Olhou para seu filho, ali, com uma pá também carregando o barro feliz com a presença do pai.

Ele adoeceu uns anos depois e ficou mentalmente perturbado. Teve que se aposentar sem, entretanto, receber uma pequena aposentadoria. Seu filho agora era o único a sustentar a casa.

José andava pela cidade e era sempre assediado para contar as histórias da guerra que ele mal conseguia contar, pois esse era o seu trauma. Lembrou alguma vez que conheceu uma linda italiana que escondeu num barracão para salvá-la dos alemães.

Ele só se lembrava da beleza daquela moça, simples, angelical, assustada, que ele nunca mais viu e nem soube.

A vida voltou ao normal na cidade, cada dia mais a guerra estava esquecida.

Para ele, não !. Ele passou a ser muito popular da cidade!

- Ô Zé Perneta, Ô Zé Perneta, .... a muié do barracão vem aqui te pegá...... Oi, Zé Perneta, ... a muié do barracão vem aqui te pegá !

Zé Perneta morreu anos depois, silente, simples, pobre e feliz por ter lutado bravamente naquele lugar tão distante para salvar os parentes de seus amigos conterrâeos, e por ter salvado aquela inocente criança, "o alemãozinho "!.

Tavez esteja agora nos braços daquela linda italianinha loirinha que com tanto carinho abrigou naquele barracão !.

... " Zé do Barro, que bom que você voltou aos meus braços! Agora teremos toda a eternidade para semearmos a paz e sermos felizes juntos! O Alemãozinho também está aqui esperando por você ! ".

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Raul Ramos Neves de Abreu
22/12/2009

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