domingo, 19 de janeiro de 2014

LA CUCINA DE ZIA NORMA !





LUCIANO PAVAROTTI (1935 - 2007)  -  FUNICULI FUNICULÁ

Logo cedo, pela manhã, já se podia ouvir daquela casa o rumor da “dolce vita de una famiglia italiana ” na tranqüila cidadezinha !.

- Mafaldinhoooo, ... ! Ô Mafaldinho ! Me põe logo tuo uniforme e me vai logo pra scuola per studare.
- Va via, mamma... va via ! Non me rompere le bale logo cedo,... cazzo !
- Va via tu figliori de un cane. Me vai correndo pra scuola che tuo pappa já foi ao lavoro!

Era muito engraçado, muito alegre, muito feliz, viver ali pertinho da “famiglia” da Dona Norma. Uma grande salada de idioma... (risos) !

Ela era uma italiana nascida na capital paulista – no Brás, e tinha traços físicos de uma linda napolitana, como lembra bem aquela atriz que fez o papel de Beatrice no filme “O Carteiro e o Poeta”, filmado na Bahia Napolitana, em especial em Procida e Ischia.

Dona Norma tinha um humor incrível: sempre sorrindo, sempre solicita, sempre pronta a dizer uma palavra carinhosa a todas as pessoas que por ali passavam, em especial as crianças que freqüentavam seu lar e eram amigas de seus filhos.

Eu era um garoto privilegiado, pois não somente era amigo de seus filhos, mas era vizinho de casa e meu quarto ficava a poucos metros da copa onde a “famiglia de Dona Norma” tomava todas as refeições.

Eu ficava ali na minha cama, quietinho, gargalhando, deliciando quando eles estavam tomando café, almoçando, jantando, ou qualquer outra coisa, pois era muito divertido ouvir tudo que diziam.

- Puta Merda, Mafi, non mi fala bobage na mesa !
- Caspita, non mi rompere le bale...!

Eu não entendia nada do que falavam em “italianês” (italiano com português), mas, até hoje, 50 anos depois, cada vez que exclamo alguma coisa, em qualquer lugar, digo logo:


“Puta merda Mafi”...

 ... e, quem ao meu lado ouve não deve entender nada, mas, é minha forma carinhosa de brincar com as pessoas, numa saudosa lembrança daqueles dias maravilhosos que convivia diariamente com aquelas  que sei que Deus colocou em nossos caminhos, em nossa vida, para tornar tudo mais bonito e mais agradável.

Meus filhos aprenderam algumas dessas expressões e, como eu, repetem sempre por onde andam de tal forma que sei que passarão adiante por muitos anos para muitas pessoas, que também levarão adiante, pela simples ternura, sem mesmo conhecerem o motivo e origem de sua história (a minha história).

Dona Norma fazia uma pizza maravilhosa. Quando eu sentia aquele cheirinho maravilhoso, era como em um filme de desenho animado:

... “o cheiro caminhava pelo ar vagarosamente até meu quarto e me levava levitando até a casa de aquela delicata signora ! ”.

PIZZA DA ZIA NORMA

- Oi Dona Norma, ... tudo bem? Ah, eu vim aqui pra brincar com o Mafaldinho.... Ele está ?
- Seu malandro, você veio aqui por causa do cheiro da minha Focaccia !.
- Focaccia? Que que é isso? A Senhora não está fazendo aquela deliciosa pizza cheia de tomates?
- Estou sim. Mas é uma focaccia. Você quer experimentar um pedacinho?
- Não, Dona Norma,... eu vim apenas ver se o Mafaldinho estava...

Dona Norma, sorrindo, não perdeu tempo e foi logo colocando um pedação daquela “Pizza Focaccia” em um prato e eu, mais que depressa, engoli aquela delicia em poucas mordidas esperando o repeteco que vinha em seguida.

- Ah, você já comeu tudo? Puxa, estava com fome mesmo... na tua casa não tem comida? ... hahaha !!! Agora você vai comer a sobremesa. Fiz uma gelatina de morango que está uma delicia !

Ela deu-me um potinho pirex (bem pequeno) com gelatina de morango, geladinha. Uma delícia! Mas, ... sorrindo sem conseguir disfarçar, deu-me uma colher de arroz, bem grande, que não cabia dentro do potinho ... !

- Dona Norma ... ! Como ... ??? !!!
- Ha, ... ha, ... ha ! ( lol ) ... você não consegue comer com essa colher ?... !

Eu nem ficava com vergonha por causa das brincadeiras da Dona Norma e, para recompensar tanto carinho dela comigo, eu levava sempre um maço de Salsões que tinha no canteiro de minha casa, pois ela adorava. Levava também os brotos de abóbora, que chamávamos de “cambuquira”, pois ela fazia vários tipos de pratos. Algumas frutas do quintal de casa, ... outras verduras,... Era o mínimo que eu poderia fazer pra demonstrar o quanto eu ficava feliz com o carinho que recebia daquela senhora.

Não posso esquecer as brincadeiras que ela fazia comigo e com as demais crianças, sempre bem humorada, mas sempre com muito carinho com todos.

" Puta merda, Mafi, ... O tempo passou. Caspita !"

 Não vejo Dona Norma há tantos anos. Nem seus filhos, seu marido que sei que já “habita o Oriente Eterno”, ... mas sempre estiveram tão presentes em minha vida, nas minhas queridas lembranças que as vezes sinto-me levitando em busca daquele saboroso aroma daquela cozinha onde, além das deliciosas comidas que ela fazia, eu sempre sentia uma  alegria tão grande, harmonia, paz e muita vontade de viver sorrindo. Estou com saudade !

“ Puta merda, Mafi ", ...

Se pudéssemos gravar o tempo e participar dele a cada momento que bate uma saudade aqui no peito, ... eu queria tanto poder dizer o quanto foram importantes em minha vida,... naqueles momentos tão maravilhosos que ficaram e estão guardados com muito carinho aqui no meu cantinho do lado esquerdo ...

...aquele vinho Chianti, ... aquele queijo gorgonzola,... a TV quando chegou à cidade,... a caminhonete onde saboreávamos ao vento no rosto,... as pescarias,... a pizza focaccia,... o Mafaldinho cantando,... as festas de aniversário,...

Que saudade !

Há uma musica "speciale" , entre tantas outras, que me transporta sempre em uma lembrança gostosa desse tempinho cheio de encantos:

... Puta merda, Mafi: nom mi fai piangere de saudade ! Puta merda, Mafi !
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Raul Ramos Neves de Abreu
            19 / 01 / 2014

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